sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Quase todos os hospitais de Trípoli estão recebendo feridos

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26 de Agosto de 2011- Uma equipe de três pessoas da organização humanitária internacional Médicos Sem Fronteiras (MSF) está atualmente em Trípoli, com suprimentos para dar apoio a instalações médicas, já sobrecarregadas com o grande volume de feridos nos confrontos na capital da Líbia. A organização também enviou equipes para Zlitan, leste de Trípoli, e Al Zawiyah, oeste, para dar apoio a hospitais que sofrem para atender um grande volume de pacientes. Jonathan Whittall, coordenador do projeto de MSF em Trípoli, descreve a situação na cidade.

Como está a situação no momento?
Jonathan Whittall- O grande problema das instalações médicas de Trípoli é que elas já estavam sobrecarregadas mesmo antes do início dos conflitos essa semana. Os hospitais já estavam sofrendo com a falta de equipes médicas – muitos desses profissionais eram estrangeiros que fugiram da Líbia. E devido às sanções impostas ao país, os hospitais tinham que lidar com a escassez de suprimentos médicos. O sistema de saúde já estava com dificuldade para lidar com os feridos vindos da frente de batalha fora de Trípoli.

Nas últimas três semanas, equipes médicas estão concentrando suas atividades quase que exclusivamente em casos de emergência, e não foram capazes de lidar com outros problemas médicos enfrentados pela população, como doenças crônicas, cesarianas de emergência, entre outras. Outros tipos de cuidados médicos simplesmente não estão disponíveis. E isso, somado aos confrontos dessa semana em Trípoli – que estão sendo muito intensos em algumas partes da cidade – faz com que a situação dos hospitais, que já estavam sobrecarregados e que não estão recebendo o apoio que precisam, em termos de equipes e materiais, fique ainda pior, pois há um fluxo ainda maior de feridos.

Qual é a situação nos hospitais que você já conseguiu avaliar?
Whittall- Quase todos os hospitais da cidade estão recebendo feridos, mas o conflito ainda deixa alguns hospitais inacessíveis, o que faz com que outros fiquem sobrecarregados. Agora que a cidade está ficando um pouco mais calma, os hospitais estão começando a receber pacientes que estavam isolados pelo conflito. Essas pessoas não são apenas os que recentemente foram feridos nos confrontos, mas também doentes, que estavam com medo de se deslocar até o hospital, e outros casos de emergência.

Os hospitais que visitei desde o início do conflito são cenários bastante caóticos. Médicos e enfermeiros não conseguem ir ao trabalho por causa da grande insegurança nas ruas. Há falta de profissionais de saúde, mas muitas pessoas se voluntariam, vão aos hospitais e ajudam da maneira que podem. Mas isso está gerando um ambiente muito caótico.

Os hospitais e clínicas que visitei estão cheios de pessoas com ferimentos a bala, tanto nas emergências quanto em outros departamentos. Em uma clínica, as equipes transformaram algumas casas próximas em locais para internar pacientes. Por exemplo, em uma das casas que visitei, os pacientes estavam deitados no chão e em mesas que haviam formado um ambulatório improvisado. No entanto, devido à falta de equipes médicas, não havia enfermeiros, e os pacientes estavam cuidando deles mesmos. Em outro hospital, pessoas esperavam do lado de fora do prédio para entrar na ala de emergência.

Existem outros obstáculos à assistência médica além dos conflitos?
Whittall- Um problema para os serviços de ambulâncias na cidade é a falta de combustíveis em Trípoli. O abastecimento com combustível vindo da Tunísia ainda não é possível. Essa é uma grande preocupação, pois o suprimento de energia é esporádico e os hospitais dependem de geradores para funcionar, mas as reservas de combustível estão acabando.  
Como MSF está respondendo à situação?

A situação médica exige uma resposta muito rápida, e é por isso que estamos trazendo mais equipes e materiais. Mais profissionais e suprimentos chegaram e outros chegarão amanhã. Vamos começar a apoiar instalações médicas imediatamente. Hoje, os conflitos continuam acontecendo em várias partes da cidade, e com certeza isso terá um impacto nas necessidades médicas.
As instalações médicas estão sobrecarregadas, mas isso não quer dizer que elas não estejam funcionando, ou que o sistema de saúde tenha entrado em colapso. Os profissionais estão cuidando dos feridos e respondendo às demandas da comunidade, mas estão, obviamente, se deparando com enormes desafios. Não é uma questão de competência ou disposição: eles precisam de apoio para poder atender melhor as necessidades urgentes e alarmantes que chegam aos hospitais.


Houve alguma melhora na intensidade dos conflitos?
Whittall- No momento, as coisas estão mais calmas. Há três dias eu não conseguia falar no telefone devido aos tiroteios e bombardeios constantes. Hoje já posso falar sem ter que me esconder atrás de paredes.

A situação é muito dinâmica, as coisas acontecem muito rapidamente. É impossível descrever o quanto a cidade mudou – e continua mudando – em tão pouco tempo. Precisamos ficar extremamente atentos sobre o modo como as coisas vão caminhar nos próximos dias.

Em um dos hospitais que não pudemos acessar devido aos conflitos, ouvimos relatos de uma situação crítica envolvendo pacientes que não recebem ajuda médica porque as equipes médicas não conseguem chegar ao hospital, já que muitos confrontos ocorrem ao redor do prédio. É essencial que os hospitais estejam operando normalmente, acessíveis a todos os pacientes, ainda mais nos próximos dias. Os profissionais precisam chegar aos hospitais, cuja integridade deve ser respeitada por combatentes de ambos os lados do conflito.


Médicos Sem Fronteiras é uma organização humanitária internacional que está presente na Líbia desde o dia 25 de fevereiro de 2011. Para garantir a independência de suas atividades médicas, a organização aceita apenas doações privadas para financiar seus projetos na Líbia, sem utilizar verbas de governos, agências ou quaisquer grupos com afiliações militares ou políticas. Atualmente, a equipe de MSF no país conta com 44 profissionais do país e 30 internacionais, incluindo brasileiros, que oferecem cuidados médicos e assistência psicológica, realizam cirurgias e dão apoio a farmácias nas cidades de Trípoli, Misrata, Zlitan, Yefren e Benghazi. 
 
Médicos Sem Fronteiras 

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