Para isso, a Marinha traçou um plano de longuíssimo prazo: até 2047, o país terá 26 submarinos patrulhando sua costa. O primeiro passo foi no final de 2008, quando o governo brasileiro firmou um convênio com a França para a transferência da tecnologia do submarino Scorpène. O segundo foi em julho de 2011, com o início da fabricação das novas embarcações no estaleiro de Itaguaí, no Rio de Janeiro. A próxima geração de submarinos brasileiros deve chegar aos mares em 2017. Mais importante que isso, no entanto, são as mudanças que os engenheiros brasileiros planejam fazer no projeto francês. A ideia é realizar um transplante: sai o motor a diesel, entra um reator nuclear. Começando agora, a Marinha espera concluir a construção do primeiro submarino movido a propulsão nuclear em 2023.
Com isso, o Brasil entraria para o seleto clube dos países que dominam a tecnologia — China, Estados Unidos, França, Inglaterra e Rússia. Para se ter uma noção da importância estratégica desse veículo, esses 5 são justamente os membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU.
Corpo de aço, coração nuclear
Segundo o almirante-de-esquadra Julio Soares de Moura Neto, atual comandante da Marinha do Brasil, o submarino é o veículo com o melhor custo/benefício na guerra naval. “Sua vantagem determinante é a capacidade de se ocultar e surpreender”, diz. Na guerra das Malvinas, por exemplo, foi o elemento surpresa que permitiu a um submarino britânico realizar o maior ataque do conflito, quando destruiu um navio argentino e matou 368 homens.
No entanto, os submarinos convencionais têm um grande inconveniente: após alguns dias submersos eles precisam voltar à superfície para literalmente pegar ar e recarregar as baterias — e lá se vai o elemento surpresa. Já o submarino nuclear, graças à capacidade quase inesgotável do seu reator, pode ficar debaixo d’água por meses e atingir altas velocidades por tempo ilimitado. “Ele pode chegar a qualquer lugar rapidamente. Para o inimigo, significa estar em todos os lugares ao mesmo tempo”, diz Moura Neto. Mas homens têm limites: quando o submarino nuclear sobe, é para repor alimentos e desestressar a tripulação.
Engenheiros brasileiros já estão na França para receber treinamento na montagem do submarino. As peças mais caras, como o casco de aço, periscópio e sonar, terão de ser importadas de lá. Já a tecnologia nuclear será totalmente desenvolvida no Brasil, e a Marinha vai usar a técnica nacional de fissão nuclear (para saber o que é fissão, leia a matéria Não faça você mesmo, nesta edição; para saber como ela move as turbinas, ver infográfico ao lado). Além disso, os submarinos virão armados com torpedos e mísseis Exocet franceses. Cada embarcação vai custar cerca de US$ 1,5 bilhão.
Tecnologia profunda
Desde os anos 70 os militares brasileiros planejam a construção de um submarino nuclear, mas sofriam com barreiras impostas pelas potências estrangeiras. A tecnologia teve de ser desenvolvida aqui dentro — em 1982, o país dominou o ciclo de combustível nuclear. A partir dos anos 90, os recursos minguaram, até a ressurreição recente do projeto. O próximo passo deve ser a construção de um reator nuclear em solo, para testar o equipamento. Ele está sendo desenvolvido no Centro Experimental Aramar, em Iperó (SP), e deve ser concluído em 2014.
Uma preocupação que envolve o projeto é a falta de profissionais para lidar com a tecnologia. A Comissão Nacional de Energia Nuclear, que em 1991 tinha 3.750 servidores, hoje tem somente 2.550 — com idade média de 56 anos. “Há uma necessidade urgente de reposição e de formação de novos profissionais”, diz José Roberto Piqueira, vice-diretor da Escola Politécnica da USP.
Pensando nisso, a USP irá abrir em 2013 um curso de graduação em Engenharia Nuclear, ao lado do centro da Marinha em Iperó. Parcerias entre as duas instituições já estão nos planos. Submarinos e engenheiros nucleares: é o Brasil buscando novos voos — ou melhor, mergulhos.
Fonte: IE
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